Instrumentando o CPython com DTrace e SystemTap

autor:

David Malcolm

autor:

Łukasz Langa

DTrace e SystemTap são ferramentas de monitoramento, cada uma fornecendo uma maneira de inspecionar o que os processos em um sistema de computador estão fazendo. Ambas usam linguagens específicas de domínio, permitindo que um usuário escreva scripts que:

  • filtrar quais processos devem ser observados

  • coletem dados dos processos de interesse

  • gerem relatórios sobre os dados

A partir do Python 3.6, o CPython pode ser criado com “marcadores” incorporados, também conhecidos como “sondas” (probes), que podem ser observados por um script DTrace ou SystemTap, facilitando o monitoramento do que os processos CPython em um sistema estão fazendo.

Detalhes da implementação do CPython: Os marcadores DTrace são detalhes de implementação do interpretador CPython. Não há garantias sobre a compatibilidade de sondas entre versões do CPython. Os scripts DTrace podem parar de funcionar ou funcionar incorretamente sem aviso ao alterar as versões do CPython.

Habilitando os marcadores estáticos

O macOS vem com suporte embutido para DTrace. No Linux, para construir o CPython com os marcadores incorporados para SystemTap, as ferramentas de desenvolvimento SystemTap devem ser instaladas.

Em uma máquina Linux, isso pode ser feito via:

$ yum install systemtap-sdt-devel

ou:

$ sudo apt-get install systemtap-sdt-dev

O CPython deve então ser configurado com a opção --with-dtrace:

checking for --with-dtrace... yes

No macOS, você pode listar as sondas DTrace disponíveis executando um processo Python em segundo plano e listando todas as sondas disponibilizadas pelo provedor Python:

$ python3.6 -q &
$ sudo dtrace -l -P python$!  # or: dtrace -l -m python3.6

   ID   PROVIDER            MODULE                          FUNCTION NAME
29564 python18035        python3.6          _PyEval_EvalFrameDefault function-entry
29565 python18035        python3.6             dtrace_function_entry function-entry
29566 python18035        python3.6          _PyEval_EvalFrameDefault function-return
29567 python18035        python3.6            dtrace_function_return function-return
29568 python18035        python3.6                           collect gc-done
29569 python18035        python3.6                           collect gc-start
29570 python18035        python3.6          _PyEval_EvalFrameDefault line
29571 python18035        python3.6                 maybe_dtrace_line line

No Linux, você pode verificar se os marcadores estáticos do SystemTap estão presentes no binário compilado, observando se ele contém uma seção “.note.stapsdt”.

$ readelf -S ./python | grep .note.stapsdt
[30] .note.stapsdt        NOTE         0000000000000000 00308d78

Se você construiu o Python como uma biblioteca compartilhada (com a opção de configuração --enable-shared), você precisa procurar dentro da biblioteca compartilhada. Por exemplo:

$ readelf -S libpython3.3dm.so.1.0 | grep .note.stapsdt
[29] .note.stapsdt        NOTE         0000000000000000 00365b68

Um readelf moderno o suficiente pode exibir os metadados:

$ readelf -n ./python

Displaying notes found at file offset 0x00000254 with length 0x00000020:
    Owner                 Data size          Description
    GNU                  0x00000010          NT_GNU_ABI_TAG (ABI version tag)
        OS: Linux, ABI: 2.6.32

Displaying notes found at file offset 0x00000274 with length 0x00000024:
    Owner                 Data size          Description
    GNU                  0x00000014          NT_GNU_BUILD_ID (unique build ID bitstring)
        Build ID: df924a2b08a7e89f6e11251d4602022977af2670

Displaying notes found at file offset 0x002d6c30 with length 0x00000144:
    Owner                 Data size          Description
    stapsdt              0x00000031          NT_STAPSDT (SystemTap probe descriptors)
        Provider: python
        Name: gc__start
        Location: 0x00000000004371c3, Base: 0x0000000000630ce2, Semaphore: 0x00000000008d6bf6
        Arguments: -4@%ebx
    stapsdt              0x00000030          NT_STAPSDT (SystemTap probe descriptors)
        Provider: python
        Name: gc__done
        Location: 0x00000000004374e1, Base: 0x0000000000630ce2, Semaphore: 0x00000000008d6bf8
        Arguments: -8@%rax
    stapsdt              0x00000045          NT_STAPSDT (SystemTap probe descriptors)
        Provider: python
        Name: function__entry
        Location: 0x000000000053db6c, Base: 0x0000000000630ce2, Semaphore: 0x00000000008d6be8
        Arguments: 8@%rbp 8@%r12 -4@%eax
    stapsdt              0x00000046          NT_STAPSDT (SystemTap probe descriptors)
        Provider: python
        Name: function__return
        Location: 0x000000000053dba8, Base: 0x0000000000630ce2, Semaphore: 0x00000000008d6bea
        Arguments: 8@%rbp 8@%r12 -4@%eax

Os metadados acima contêm informações sobre o SystemTap descrevendo como ele pode corrigir instruções de código de máquina estrategicamente posicionadas para habilitar os ganchos de rastreamento usados ​por um script do SystemTap.

Sondas estáticas do DTtrace

O script DTrace de exemplo a seguir pode ser usado para mostrar a hierarquia de chamada/retorno de um script Python, rastreando apenas dentro da invocação de uma função chamada “start”. Em outras palavras, invocações de função em tempo de importação não serão listadas:

self int indent;

python$target:::function-entry
/copyinstr(arg1) == "start"/
{
        self->trace = 1;
}

python$target:::function-entry
/self->trace/
{
        printf("%d\t%*s:", timestamp, 15, probename);
        printf("%*s", self->indent, "");
        printf("%s:%s:%d\n", basename(copyinstr(arg0)), copyinstr(arg1), arg2);
        self->indent++;
}

python$target:::function-return
/self->trace/
{
        self->indent--;
        printf("%d\t%*s:", timestamp, 15, probename);
        printf("%*s", self->indent, "");
        printf("%s:%s:%d\n", basename(copyinstr(arg0)), copyinstr(arg1), arg2);
}

python$target:::function-return
/copyinstr(arg1) == "start"/
{
        self->trace = 0;
}

Pode ser invocado assim:

$ sudo dtrace -q -s call_stack.d -c "python3.6 script.py"

O resultado deve ser algo assim:

156641360502280  function-entry:call_stack.py:start:23
156641360518804  function-entry: call_stack.py:function_1:1
156641360532797  function-entry:  call_stack.py:function_3:9
156641360546807 function-return:  call_stack.py:function_3:10
156641360563367 function-return: call_stack.py:function_1:2
156641360578365  function-entry: call_stack.py:function_2:5
156641360591757  function-entry:  call_stack.py:function_1:1
156641360605556  function-entry:   call_stack.py:function_3:9
156641360617482 function-return:   call_stack.py:function_3:10
156641360629814 function-return:  call_stack.py:function_1:2
156641360642285 function-return: call_stack.py:function_2:6
156641360656770  function-entry: call_stack.py:function_3:9
156641360669707 function-return: call_stack.py:function_3:10
156641360687853  function-entry: call_stack.py:function_4:13
156641360700719 function-return: call_stack.py:function_4:14
156641360719640  function-entry: call_stack.py:function_5:18
156641360732567 function-return: call_stack.py:function_5:21
156641360747370 function-return:call_stack.py:start:28

Marcadores estáticos do SystemTap

A maneira de baixo nível de usar a integração do SystemTap é usar os marcadores estáticos diretamente. Isso requer que você declare explicitamente o arquivo binário que os contém.

Por exemplo, este script SystemTap pode ser usado para mostrar a hierarquia de chamada/retorno de um script Python:

probe process("python").mark("function__entry") {
     filename = user_string($arg1);
     funcname = user_string($arg2);
     lineno = $arg3;

     printf("%s => %s in %s:%d\\n",
            thread_indent(1), funcname, filename, lineno);
}

probe process("python").mark("function__return") {
    filename = user_string($arg1);
    funcname = user_string($arg2);
    lineno = $arg3;

    printf("%s <= %s in %s:%d\\n",
           thread_indent(-1), funcname, filename, lineno);
}

Pode ser invocado assim:

$ stap \
  show-call-hierarchy.stp \
  -c "./python test.py"

O resultado deve ser algo assim:

11408 python(8274):        => __contains__ in Lib/_abcoll.py:362
11414 python(8274):         => __getitem__ in Lib/os.py:425
11418 python(8274):          => encode in Lib/os.py:490
11424 python(8274):          <= encode in Lib/os.py:493
11428 python(8274):         <= __getitem__ in Lib/os.py:426
11433 python(8274):        <= __contains__ in Lib/_abcoll.py:366

sendo as colunas:

  • tempo em microssegundos desde o início do script

  • nome do executável

  • PID do processo

e o restante indica a hierarquia de chamada/retorno conforme o script é executado.

Para uma construção com --enable-shared do CPython, os marcadores estão contidos na biblioteca compartilhada libpython, e o caminho pontilhado da sonda precisa refletir isso. Por exemplo, esta linha do exemplo acima:

probe process("python").mark("function__entry") {

deve ler-se em vez disso:

probe process("python").library("libpython3.6dm.so.1.0").mark("function__entry") {

(presumindo uma construção de depuração do CPython 3.6)

Marcadores estáticos disponíveis

function__entry(str filename, str funcname, int lineno)

Este marcador indica que a execução de uma função Python começou. Ele é acionado somente para funções Python puro (bytecode).

O nome do arquivo, o nome da função e o número da linha são fornecidos de volta ao script de rastreamento como argumentos posicionais, que devem ser acessados ​usando $arg1, $arg2, $arg3:

  • $arg1 : nome de arquivo como (const char *), acessível usando user_string($arg1)

  • $arg2 : nome da função como (const char *), acessível usando user_string($arg2)

  • $arg3 : número da linha como int

function__return(str filename, str funcname, int lineno)

Este marcador é o inverso de function__entry(), e indica que a execução de uma função Python terminou (seja via return, ou via uma exceção). Ele é acionado somente para funções Python puro (bytecode).

Os argumentos são os mesmos de function__entry()

line(str filename, str funcname, int lineno)

Este marcador indica que uma linha Python está prestes a ser executada. É o equivalente ao rastreamento linha por linha com um perfilador Python. Ele não é acionado dentro de funções C.

Os argumentos são os mesmos de function__entry().

gc__start(int generation)

Dispara quando o interpretador Python inicia um ciclo de coleta de lixo. arg0 é a geração a ser percurrida, como gc.collect().

gc__done(long collected)

Dispara quando o interpretador Python termina um ciclo de coleta de lixo. arg0 é o número de objetos coletados.

import__find__load__start(str modulename)

Dispara antes de importlib tentar encontrar e carregar o módulo. arg0 é o nome do módulo.

Adicionado na versão 3.7.

import__find__load__done(str modulename, int found)

Dispara após a função find_and_load do importlib ser chamada. arg0 é o nome do módulo, arg1 indica se o módulo foi carregado com sucesso.

Adicionado na versão 3.7.

audit(str event, void *tuple)

Dispara quando sys.audit() ou PySys_Audit() é chamada. arg0 é o nome do evento como string C, arg1 é um ponteiro PyObject para um objeto tupla.

Adicionado na versão 3.8.

Tapsets de SystemTap

A maneira mais avançada de usar a integração do SystemTap é usar um “tapset”: o equivalente do SystemTap a uma biblioteca, que oculta alguns dos detalhes de nível inferior dos marcadores estáticos.

Aqui está um arquivo tapset, baseado em uma construção não compartilhada do CPython:

/*
   Fornece um envólucro de mais alto nível em volta dos marcadores
   function__entry e function__return:
 \*/
probe python.function.entry = process("python").mark("function__entry")
{
    filename = user_string($arg1);
    funcname = user_string($arg2);
    lineno = $arg3;
    frameptr = $arg4
}
probe python.function.return = process("python").mark("function__return")
{
    filename = user_string($arg1);
    funcname = user_string($arg2);
    lineno = $arg3;
    frameptr = $arg4
}

Se este arquivo for instalado no diretório de tapsets do SystemTap (por exemplo, /usr/share/systemtap/tapset), estes pontos de sondagem adicionais ficarão disponíveis:

python.function.entry(str filename, str funcname, int lineno, frameptr)

Este ponto de sondagem indica que a execução de uma função Python começou. Ele é acionado somente para funções Python puro (bytecode).

python.function.return(str filename, str funcname, int lineno, frameptr)

Este ponto de sondagem é o inverso de python.function.return, e indica que a execução de uma função Python terminou (seja via return, ou via uma exceção). Ele é acionado somente para funções Python puro (bytecode).

Exemplos

Este script SystemTap usa o tapset acima para implementar de forma mais limpa o exemplo dado acima de rastreamento da hierarquia de chamada de função Python, sem precisar na diretamente

probe python.function.entry
{
  printf("%s => %s in %s:%d\n",
         thread_indent(1), funcname, filename, lineno);
}

probe python.function.return
{
  printf("%s <= %s in %s:%d\n",
         thread_indent(-1), funcname, filename, lineno);
}

O script a seguir usa o tapset acima para fornecer uma visão geral de todo o código CPython em execução, mostrando os 20 quadros de bytecode mais frequentemente inseridos, a cada segundo, em todo o sistema:

global fn_calls;

probe python.function.entry
{
    fn_calls[pid(), filename, funcname, lineno] += 1;
}

probe timer.ms(1000) {
    printf("\033[2J\033[1;1H") /* clear screen \*/
    printf("%6s %80s %6s %30s %6s\n",
           "PID", "FILENAME", "LINE", "FUNCTION", "CALLS")
    foreach ([pid, filename, funcname, lineno] in fn_calls- limit 20) {
        printf("%6d %80s %6d %30s %6d\n",
            pid, filename, lineno, funcname,
            fn_calls[pid, filename, funcname, lineno]);
    }
    delete fn_calls;
}